E se
de um momento para o outro ninguém morresse? E se de repente todos nós pudéssemos
viver eternamente? Certamente, o primeiro pensamento que emergiu na mente de
qualquer individuo teve um carácter positivo. Quem não quer viver plenamente e
não pensar sequer na palavra morte? O ser humano é um ser frágil, mortal e
que, inevitavelmente, tem medo da morte.
“No
dia seguinte ninguém morreu”, é assim que Saramago começa o seu romance. Um
romance perturbador, envolvente e carismático. As intermitências da morte não passam em vão. As intermitências da morte fazem-nos pensar, mudam o nosso prisma. As intermitências da morte fazem-nos
deixar de ter medo. As intermitências da
morte remetem-nos para um fatalismo inevitável. As intermitências da morte aqui ganham significado,
personificam-se.
Saramago
consegue retratar a história de um país onde a morte deixou de actuar.
Ninguém morre. Todos têm o direito à vida. Mas, também aqui Saramago consegue mostrar
o outro lado da morte, o lado de necessidade. A morte faz parte da vida. A
morte está intrinsecamente ligada à vida. Nada, nem ninguém pode anular o facto
de que um dia todos vamos fugir deste mundo. Não vale a pena ser-se bom ou mau,
no fim, todos perdemos o direito de pertencer a esta terra. A morte aqui ganha
sentido, aliás, ela sublinha o seu sentido.
A
morte personifica-se. O romance parte da própria morte e da sua incapacidade de
actuar devido ao amor. Saramago une inteligentemente duas coisas que à partida
parecem ser como a água e o azeite. Aqui a morte e o amor andam de mãos dadas.
A morte ganha vida e não consegue tirar do mundo quem tinha de tirar. O amor
fala mais alto, aliás, o amor grita. E a morte ouve-o, muito atenta. Por mais
que lute contra aquilo que sente, a morte não resiste.
A
escrita de Saramago aliada ao seu poder visionário faz deste romance algo inacreditável.
Uma história que à partida parece seca, fria e crua torna-se num enredo
poderoso e cativante. Nem sempre aquilo que parece bom numa primeira fase o é
na realidade. Aquilo que está à frente dos nossos olhos nem sempre é claro, visível.
A tarefa de procurar, pensar e não desistir parte de nós. Por isso, fecha os
olhos. Pensa naquilo que tens como garantido. Agora, abre os olhos. Será que
continuas a achar que tudo o que tens hoje amanhã está lá?
2 comentários:
Sem sombra de dúvuda um dos meus livros preferidos, que me ajudou a aceitar a morte, quando com ela convivia diariamente...
Concordo plenamente contigo, Tanya. Este é sem dúvida um livro que nos ensina a lidar com a morte, ou pelo menos a vê-la de uma forma menos negativa. Obrigada pelo teu comentário. Esperamos que nos continues a visitar.
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